A família do renomado pintor Pablo Picasso contratou o
restaurador de obras de arte Flávio Capitulino, natural de Sousa-PB, para
restaurar quadros inéditos do pintor espanhol, que nunca foram apresentados ao
público. A informação está publicada na edição desta terça-feira (02) do Jornal
da Paraíba, na coluna social de Celino Neto.
Segundo a informação publicada por Celino, as obras agora
estão em exposição na Galerie De La Bouquinerie, em Paris, onde ficarão até o
dia 15 de dezembro. Flávio Capitulino, 46 anos, deixou a Paraíba e foi morar em
Paris no ano de 1982, onde fez faxina, cuidou de bebês e dançou lambada com
boneca de pano na porta do Beaubourg, o principal centro cultural francês.
Levava US$ 50 e não sabia pedir um copo d'água em francês.
Hoje, é um dos principais restauradores de obras de arte da
França e tem na sua lista de clientes o próprio Beaubourg e o Museu D'Orsay. Já
restaurou obras de Gauguin, Renoir e Modigliani. Na cidade de Sousa, restaurou uma
capela de 1730, a igreja Nossa Senhora do Rosário. No Brasil, também já deu cursos
em São Paulo, ensinando algumas técnicas que criou.
Filho de agricultores, ele nasceu na roça e foi criado em
Campina Grande, onde se dividia entre o trabalho de padeiro e bicos como
decorador. Seu sonho era ser pintor em Paris. Mas, só conseguiu juntar dinheiro
para comprar a passagem de ida para a França; um tio teve de financiar a de
volta, obrigatória à época para conseguir o visto.
“Eu trabalhava tanto para juntar dinheiro que dormia duas
horas por noite”, lembra. Sua chegada a Paris não foi melhor. Foi com a
promessa de que poderia ficar o quanto quisesse na casa de um casal francês que
conhecera na Paraíba. Mas, uma semana depois, foi convidado a se retirar.
Sem falar francês, diz que foi para as ruas repetindo uma
única pergunta: “Você fala português?”. Uma portuguesa foi a sua salvação.
Indicou-lhe a Maison du Brasil, onde vivem os brasileiros que estudam em Paris.
Ganhou abrigo e a sugestão de que os únicos empregos que conseguiria seriam os
de faxineiro e de babá.
Cuidou de crianças até se deparar com uma mesa de laca
chinesa, toda descascada, na casa de seus patrões. “Insisti tanto que me
deixaram restaurar a mesa”. Seus patrões ficaram tão encantados com o
resultado, segundo Capitulino, que convidaram uma restauradora do Louvre para
ver a mesa. Não tinha vaga no Louvre, mas a restauradora indicou Capitulino a
um ateliê privado.
“Foi outra novela. Eles queriam saber qual era a minha
experiência e eu tinha só uma mesa no currículo. Pedi uma semana para mostrar o
que sabia, tudo por intuição, e três meses depois eu era chefe do ateliê”, diz
Capitulino.
Hoje, ele tem seu próprio ateliê, onde restaurou a tela “Mulher
com Rosa”, de Gauguin, avaliada em US$ 40 milhões. Dos mais de dez Renoir que
recuperou, o mais valioso está no Museu D'Orsay (“A Dançarina”). “Vista de
Ponte Neuf”, um Cézanne que pertence a uma galeria parisiense, também foi
recuperada por Capitulino.
Capitulino diz ter aprendido e criado uma série de técnicas
de restauro por intuição – só depois de estar trabalhando é que foi estudar a
história das técnicas. Da padaria em que trabalhou a partir dos 6 anos,
aprendeu que limão não deixa o caramelo cristalizar. Foi exatamente com
caramelo que ele criou uma técnica para colar pintura sobre vidro quando
quebram.
“Uso açúcar, fungicida para matar os bichos e gotas de
limão. Qualquer outra cola afetaria a cor da pintura no vidro. Com o caramelo
isso não acontece”, diz. O poder adesivo do caramelo ele descobriu no sertão. “Antigamente,
quando não havia laquê, as pessoas usavam água com açúcar para fazer penteados
no Nordeste. Lembrei disso quando me deram um trabalho em vidro para colar”.
Para limpar óleo sobre tela, ele descobriu uma técnica nova,
que não usa solvente, produto que sempre afeta a imagem pintada. Ele emprega
breu moído para tirar sujeiras que se acumulam no verniz que era usado para
proteger a pintura. Casca de ovo e cera de abelha também viraram material de
restauro nas mãos de Capitulino.
“Não aceito a ideia de que há uma receita para restaurar um
quadro. Considero cada quadro como se fosse um paciente. E para cada caso há um
medicamento. Sou uma espécie de médico da arte”, define. Médico muito bem pago,
aliás. Capitulino não fala quanto ganha, mas dá uma pista: “Eu poderia passar
quantos fins-de-semana quisesse no Brasil, viajando de primeira classe”. Coisa
de quem tem US$ 6 mil, o preço da passagem, para desperdiçar quando quiser.
Do Blog Carlos Magno, com JP e Folha / Fotos: Celino Neto