A Polícia Federal do Rio Grande do Sul investiga um homem,
de 38 anos, suspeito de se passar por agente da PF e aplicar golpes em quatro
estados. Daniel Lopes da Silveira foi preso preventivamente há duas semanas em
um shopping de São Paulo, e depois levado a Porto Alegre, onde segue na Cadeia
Pública. A defesa disse que irá protocolar um pedido de liberdade.
De acordo com a polícia, o homem, natural de Novo Hamburgo,
na Região Metropolitana de Porto Alegre, enganava principalmente mulheres para
obter dinheiro. Ele se aproximava das vítimas via redes sociais, se apresentava
como policial federal e mantinha relacionamentos afetivos com elas.
Para sustentar a farsa, desde 2015 o homem postava fotos em
um perfil nas redes sociais vestindo uniforme da PF e segurando uma arma.
"A partir daí, criava histórias de que precisava de
dinheiro para liberar mercadorias apreendidas antes que fossem a leilão,
oferecia visto, alegava que tinha um imóvel muito caro, que precisava pagar
taxa, e que tinha tido o salário suspenso", lista o delegado federal João
Rocha, que investiga o caso.
Vítimas também relataram à polícia que o homem buscava bons
hotéis em outros estados e utilizava o cartão de crédito delas. Em troca de
dinheiro, prometia ainda vantagens às companheiras, parentes e amigos delas. O
falso agente oferecia vistos norte-americanos, passaportes e mercadorias
apreendidas por valores abaixo do mercado.
Ele recebia o dinheiro, mas as promessas não eram cumpridas.
Nesse momento, segundo a polícia, se tornava agressivo e partia para ameaças.
Por vezes, o relacionamento acabava, sem que ele cumprisse o prometido. Em
outros casos, ele simplesmente desaparecia.
Daniel prestou depoimento à Polícia Federal e, segundo o
delegado, assumiu os atos.
"No primeiro momento, ele negou, mas, diante do volume
de provas, admitiu que realmente se passava por um policial federal. Disse que
enganava elas com o objetivo de obter vantagem financeira", relata João
Rocha.
Na residência dele, na Região Metropolitana de Porto Alegre,
foram apreendidos alguns itens, entre eles, um uniforme não-oficial da Polícia
Federal e uma arma de pressão, que imitava uma arma de verdade.
'Éramos um casal
normal'
O G1 conversou com uma das vítimas, que preferiu ter a sua
identidade preservada. A mulher relatou que conheceu Daniel pelo Facebook no
início de 2017 e que, logo após o primeiro encontro, já foi apresentada à
família dele.
O rapaz, que vivia com a mãe, contou que estava afastado
temporariamente da PF por questões administrativas, mas que, em breve, iria
retornar ao trabalho. Não demorou muito para que pedisse para morar com ela.
Em fevereiro de 2017, o homem se mudou para a casa da
vítima, em Novo Hamburgo, onde ficou até outubro de 2018.
"Nós éramos um casal normal. Ele veio morar comigo,
conheceu meu filho, minha mãe", conta a mulher.
"Começava muito bem, com flores, elogiando. Depois da
conversa, dessa lábia, ele conseguia te manipular", lembra.
O primeiro episódio que ela considerou estranho aconteceu em
junho de 2017. De acordo com a mulher, Daniel disse que iria viajar em uma
sexta-feira para uma operação da Polícia Federal em São Paulo e voltaria no
domingo. A viagem não foi marcada com antecedência, ele a avisou um dia antes.
"Só que nesse mesmo final de semana, uma amiga minha
encontrou ele no Morro da Borússia [Osório, Rio Grande do do Sul]. Ela relatou
que viu ele com outra mulher. Só que ele não conhecia ela. Ela conhecia ele por
fotos. Ela fez fotos e vídeos dele de mãos dadas com outra mulher", relata
a vítima.
Questionado, o homem teria enviado fotos da operação, áudios
com barulho de helicóptero e negado a visita ao local durante o fim de semana.
A mulher conta que essa foi só uma das mentiras inventadas
pelo ex-companheiro. Enquanto se relacionava com outras mulheres, ele pedia
dinheiro emprestado para ela, para a mãe dela, para amigos, utilizava seu
cartão de crédito e sempre dizia que estava aguardando o recebimento do salário
da PF. Problema na conta bancária era uma das justificativas para a demora.
"Às vezes, ele aparecia com um pouco de dinheiro em
casa, mas eu não sabia de onde vinha. Vinha de outras mulheres", afirma.
"Ele gostava muito de ostentar, ir para Gramado, tomar
espumante, viajar... Eu tinha um carro popular, e ele me fez pegar um carro de
R$ 100 mil para manter a pose de policial federal", conta.
Os empréstimos nunca foram pagos. Conforme a mulher, em
determinada manhã, ele simplesmente saiu para trabalhar, uniformizado, disse
que voltaria à noite e nunca mais apareceu.
Após sofrer ameaças, ela decidiu se mudar para outro
município. Hoje, a funcionária pública está afastada do trabalho por depressão.
"Eu estou no SPC, pagando dívidas dele até hoje, estou
praticamente falida. Antes dele, tinha uma vida normal, tranquila. E assim ele
fez com as outras também. Existem vários 'Danieis' por aí", alerta a
mulher.
Pelo menos 10 vítimas
identificadas
A investigação iniciou em março deste ano a partir de uma
denúncia sobre a atuação do suspeito. Os golpes, segundo a polícia, foram
aplicados no Rio Grande do Sul, em Santa Catarina, no Paraná e em São Paulo.
O delegado diz que o suspeito chegava a manter mais de um
relacionamento ao mesmo tempo com mulheres de estados diferentes. Ele se dizia
de um grupo tático da PF que precisava viajar para operações.
"Tinha relacionamento com uma vítima de São Paulo e
dizia para a vítima do Rio Grande do Sul que estava viajando a serviço",
afirma João Rocha.
Conforme a PF, pelo menos 10 vítimas já foram identificadas,
cada uma com prejuízos que variam de R$ 15 mil a R$ 30 mil. Outras duas
mulheres serão ouvidas nesta semana.
Algumas mantiveram o relacionamento com o homem por meses,
outras por anos. "A pessoa não queria acreditar ou não achava que pudesse
ser possível", justifica o delegado.
O telefone e um notebook do suspeito também serão periciados
antes da conclusão do inquérito. Conforme o delegado, ele deve responder por
estelionato, ameaça e uso de símbolo público.
A Polícia Federal reforça que mulheres que tenham sido
enganadas devem procurar a unidade da polícia mais próxima para fazer uma
denúncia.
O que diz a defesa
Ao G1, a advogada que representa Daniel disse que pediu a
soltura do seu cliente, mas diante de parecer contrário do Ministério Público,
a Justiça decidiu por mantê-lo preso.
"Agora, vamos entrar com um habeas corpus. Ele está
colaborando com as investigações", garante a advogada Josiane Leal Schambeck.
A defesa do suspeito requer que o caso seja tratado na
esfera cível e não na esfera criminal.
"Na verdade, ele pediu empréstimos para algumas pessoas
que ele teve relacionamento. No que tange à questão de policial federal, ele
não chegava se apresentando como um policial federal, durante as conversas,
quando alguém perguntava, ele afirmava que era", ressalta a advogada.
Sobre os materiais apreendidos na residência dele e fotos em
sites de redes sociais, a defesa alega que os artigos eram "de cunho fantasioso
dele, nada que fosse usado para algum fim ilícito" – G1.
Carlos Magno
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