O resultado foi mesmo o esperado. A Câmara dos Deputados dos
Estados Unidos, comandada pelos democratas, aprovou por 230 votos a 197 votos o
impeachment do presidente Donald Trump.
Agora, caberá ao Senado decidir se o presidente cometeu
abuso de poder e obstrução de investigação no Congresso e se ele deve perder
seu mandato, no começo do próximo ano.
Trump se tornou o terceiro presidente na história americana
a sofrer um processo de impeachment e dependerá de seu próprio partido para se
salvar. No Senado, são necessários 67 dos 100 votos para que o presidente seja
impedido — e os republicanos detêm 53 assentos na casa.
Numericamente, se todos os republicanos votarem unidos por
Trump, o presidente não tem nada a temer. E essa é hoje a tendência: não só
porque o impeachment se tornou uma disputa polarizada entre os partidos, com
menos de 10% dos eleitores republicanos favoráveis à retirada de Trump da Casa
Branca, mas porque o presidente controla sua própria agremiação.
"Hoje, Trump tem mais apoio dentro do partido do que a
maior parte dos candidatos republicanos na história e há uma percepção de que
ele salvou a legenda, dando uma nova orientação clara para os republicanos em
assuntos como imigração e comércio e injetando um novo grau de energia ao
debate. Agora, o partido é competitivo nos 50 estados", afirmou à BBC News
Brasil o analista político Michael Johns, um dos responsáveis pelos discursos
do ex-presidente George H. W. Bush.
Johns se refere à política de Trump de endurecimento contra
imigrantes, que inclui a construção de um muro na fronteira com o México; à
guerra comercial da atual gestão com a China; além da elaboração de um novo
tratado comercial com México e Canadá, que, de acordo com trumpistas, seria
mais benéfico aos americanos que os termos anteriores.
O líder da maioria no Senado, o republicano Mitch McConnell,
já deixou claro, na última terça-feira, a disposição da Casa em livrar o
presidente — antes mesmo que a Câmara decidisse pelo indiciamento de Trump.
"Eu não sou um jurado imparcial", disse McConnell.
"Este é um processo político. Não há nada judicial nele. O impeachment é
uma decisão política".
Longe de ser um aliado de primeira hora de Trump, McConnell
expressa a transformação enfrentada pelo Partido Republicano nos últimos quatro
anos, quando Trump, então abertamente um outsider entre 17 postulantes, ganhou
a disputa pelo posto de candidato dos republicanos.
Em junho de 2016, apenas um mês antes de Trump ser nomeado
candidato, McConnell, senador por Kentucky, chegou a sugerir que ele usasse
roteiros e teleprompter em seus discursos. O parlamentar republicano também
condenou duramente comentários de Trump sobre a ascendência mexicana de um juiz
federal americano.
"Totalmente inapropriado", disse McConnell na
época. "Ele precisa começar a agir como um candidato a presidente".
De lá pra cá, no entanto, os críticos ao presidente dentro
do próprio partido perderam tração. Mesmo o atual senador pelo Texas Ted Cruz,
o principal oponente de Trump nas primárias de 2016, a quem chegou a chamar de
"mentiroso crônico"e "amoral", tem liderado as linhas de
defesa de Trump no Senado.
"Não há legislação federal que considere abuso de poder
uma ofensa criminal. Eles (democratas) acabaram de inventar isso", disse
Cruz na semana da votação do impeachment na Câmara.
"As relações não foram sempre harmoniosas entre os
republicanos no Senado e a Casa Branca, mas esse tempo acabou", afirma
Michael Johns.
A percepção entre políticos e analistas é que, se em 2016
Trump dependeu da máquina republicana para se eleger, agora são os políticos
republicanos que dependem da popularidade de Trump com a base eleitoral
conservadora para conquistar mandatos em 2020. Mesmo em meio a um processo de
impeachment, Trump é hoje visto como o mais importante cabo eleitoral do
partido e ocupou os postos-chave na máquina partidária com aliados fiéis.
O dia da votação na Câmara foi um ensaio do que deverá ser a
linha de atuação dos dois partidos no Senado.
Trump é acusado de orquestrar uma troca de favores com o
presidente ucraniano Volodymyr Zelensky. Zelensky deveria anunciar uma
investigação contra um dos possíveis oponentes do americano na eleição de 2020,
o pré-candidato democrata Joe Biden, cujo filho atuou como diretor em uma
empresa de gás daquele país. Em troca, Trump liberaria um auxílio militar de
quase US$400 milhões aos ucranianos e receberia Zelensky na Casa Branca.
De um lado, os democratas tentavam caracterizar o presidente
como um homem com malfeitos a esconder e que colocava em risco a segurança
nacional em nome de interesses pessoais. "Ninguém está acima da lei, nem
mesmo o presidente", repetiam os parlamentares democratas.
De outro lado, os republicanos se esforçavam para qualificar
o processo como um ataque político, "uma tentativa de reescrever o
resultado eleitoral de 2016". Por essa perspectiva, Trump seria uma vítima
de perseguição.
Em carta enviada um dia antes da votação à presidente da
Câmara, a democrata Nancy Pelosi, Trump deixou clara a estratégia.
"As bruxas de Salém tiveram um processo judicial mais
justo", escreveu Trump sobre seu processo de impeachment, fazendo uma
referência ao julgamento de dezenas de pessoas acusadas de bruxaria na América
colonial, nos anos 1690. O caso resultou no enforcamento das supostas bruxas e
é considerado exemplar da histeria e falta de direito à defesa do período.
Na Câmara, Trump foi convidado a depor, mas se recusou.
Se no Senado, Trump deve ser salvo sem dificuldades, ainda
não está claro o impacto do processo de impeachment na escolha dos eleitores no
fim de 2020.
As pesquisas mostram um país dividido entre apoiar e
rejeitar o impeachment: 47% a favor versus 43% contra. Uma pesquisa do jornal
Washington Post, no entanto, mostrou que nos chamados swing states - aqueles
estados em que a preferência entre candidatos republicanos ou democratas
costuma variar — 51% se dizem contrários ao processo.
Entre republicanos e democratas, no entanto, a expectativa é
que o processo de impeachment sirva ao menos para acentuar o interesse dos
eleitores em política e, considerando-se que o voto não é obrigatório no país,
tirá-los de casa para votar – BBC News.
Carlos Magno
VEJA TAMBÉM:
- Cheirar
pum pode prevenir câncer, AVC, ataque cardíaco, artrite e demência, diz estudo
de universidade do Reino Unido
-
Assassinato de moradores de rua em Campina Grande-PB gera comoção: radialista
faz artigo em homenagem a "Maria Suvacão"
- UEPB vai ganhar curso de
Medicina no campus de Campina Grande. Veja detalhes
-Cliente que passar mais de
20 minutos em fila de banco na Paraíba receberá indenização
-
Jovem forja a própria morte para saber "quais pessoas se importariam com
sua ausência" e vem a público pedir desculpas