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01/04/2020

Afastado até de Trump, Bolsonaro lidera negacionismo do coronavírus no mundo e incentiva ‘fake news’, diz revista americana


“O movimento negacionista do coronavírus agora tem um líder”. Foi com essa manchete que a revista norte-americana The Atlantic descreveu os discursos diários que o presidente Jair Bolsonaro promove contra as medidas de distanciamento social decretadas por governadores e prefeitos e recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelo próprio Ministério da Saúde para conter a pandemia do coronavírus. No início da crise, o ultradireitista parecia seguir os passos do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que também minimizava os efeitos da Covid-19.

 

Mas até mesmo Trump, vendo que seu país se transformara em epicentro mundial do novo vírus, mudou de atitude: negociou com o Congresso um pacote de dois trilhões de dólares (cerca de 10 trilhões de reais) para resgatar a economia, adotou um tom de conciliação com governadores, estendeu até 30 de abril as restrições à circulação e, no último fim de semana, chegou a dizer que poderia instituir o chamado lockdown nos Estados de Nova York, New Jersey e Connecticut. Em suma, o republicano deixou de lado a retórica de que a atividade econômica não pode e passou a salientar que, neste momento, a saúde dos estadounidenses deve ser a prioridade.



 

Bolsonaro, por ora, ignora a guinada daquele que lhe serve como modelo político e vem insistindo que as pessoas devem sair às ruas e trabalhar normalmente. “É um nível de irresponsabilidade que nunca vi num líder democraticamente eleito. Bolsonaro faz Trump parecer Churchill”, ironizou Ian Bremmer, presidente da consultoria de risco Eurasia Group, no Twitter.

 

Agindo de maneira errática logo após atender as demandas de governadores, o mandatário brasileiro determinou em pronunciamento em cadeia nacional na passada terça-feira que “algumas poucas autoridades estaduais e municipais devem abandonar o conceito de terra arrasada, a proibição de transportes, o fechamento do comércio e o confinamento em massa”. Também aproveitou a ocasião para forjar inimigos e se referir ao coronavírus como uma mera “gripezinha”.

 

Isolado politicamente, Bolsonaro dobrou a aposta na radicalização de sua base e estimulou as carretas de empresários em várias cidades pedindo pela reativação das atividades desde a sexta-feira. Além disso, mais uma vez driblou todas as orientações de médicos e especialistas e passeou no domingo por mercados e centrais de vendedores ambulantes na periferia de Brasília. Durante o chamado “coronatour”, o presidente cumprimentou cidadãos de Taguatinga, Ceilândia e Sobradinho, além de reforçar sua tese de que é importante fortalecer a economia.

 

Alguns analistas acreditam que Bolsonaro não quer ser visto como responsável pela recessão na economia, diante de mortes inevitáveis, segundo sua visão. Por outro lado, se governadores e prefeitos têm sucesso em suas medidas e consigam conter o coronavírus, ele ainda poderia argumentar que estava certo ao dizer que não havia demasiados riscos para a saúde da população.

 

O presidente e seu entorno mais radical — sobretudo seus filhos — também vêm divulgando e incentivando medidas contra o isolamento ou fazendo ênfase sobre possíveis curas para o coronavírus. No domingo, o Twitter decidiu pela primeira vez barrar conteúdo compartilhado pelo ultradireitista e pagou dois vídeos que havia postado contra o isolamento social. Nesta segunda foi a vez do Facebook e do Instagram decidirem fazer o mesmo por considerar que conteúdo promovia a desinformação. O vídeo mostrava o presidente conversando com um ambulante: “Eles querem trabalhar. é o que eu tenho falado desde o começo”, dizia. “Aquele remédio lá, hidroxicloroquina, está dando certo em tudo o que é lugar”, continuava. Em nota ao portal BBC News Brasil, justificou a remoção dizendo que "viola nossos padrões da comunidade, que não permitem desinformação que possa causar danos reais às pessoas”.

 

Nesta segunda, em entrevista ao canal de televisão aberto Rede TV, Bolsonaro voltou a questionar os números de mortes provocadas pela Covid-19. “Parece que há interesse por parte de alguns governadores de inflar o número”, disse o presidente, ecoando uma notícia falsa, espalhada em grupos de WhatsApp e nas redes, de que um porteiro ou borracheiro teria tido sua morte erroneamente incluída nas estatísticas de coronavírus (veja aqui os números em tempo real).

 

O que Bolsonaro faz é utilizar “uma comunicação meticulosamente arquitetada para ironizar e atacar inimigos ideológicos e políticos, da imprensa ao médico Drauzio Varella, passando por governadores e prefeitos adversários", opina o cientista político Vinícius do Valle. “Bolsonaro quer, na verdade, o caos”, conclui Valle.

 

O motivo de querer o caos se deve à própria natureza do bolsonarismo, que precisa do conflito para se manter e se expandir, segundo Valle e outros estudiosos, como o historiador argentino Federico Finchelstein. “Eventualmente a realidade se impõe e inclusive os seguidores mais fanáticos em algum ponto deixam de acreditar neles. Mas, quando isso acontece, já terá havido muito sofrimento e muitas vítimas, no sentido literal do termo.

 

As políticas de ajuste, de repressão e de discriminação têm suas consequências”, disse Finchelstein ao EL PAÍS na semana passada. Para Valle, Bolsonaro poderia encontrar na convulsão social a justificativa que precisa para tentar concentrar ainda mais poder em suas mãos, seja a partir de operações de Garantia da Lei e da Ordem ou da decretação de um Estado de Sítio – EL PAÍS.

 

Carlos Magno

 

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