O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu nesta
terça-feira (25), por unanimidade, abrir procedimento administrativo disciplinar
para apurar a conduta do desembargador Eduardo Almeida Prado Rocha de Siqueira.
Ele será afastado das funções até o fim do processo.
Siqueira foi flagrado em vídeo, em julho, humilhando um
guarda civil municipal depois de o agente ter pedido a ele que colocasse
máscara de proteção em uma praia de Santos, no litoral de São Paulo.
Nas imagens, Siqueira chama o guarda de 'analfabeto', rasga
a multa e joga o papel no chão. Enquanto o documento é lavrado, o desembargador
tenta dar uma "carteirada" ao telefonar para o secretário de
Segurança Pública de Santos, Sérgio Del Bel.
Em outro vídeo, de maio, ele já havia desrespeitado e
ameaçado um inspetor da guarda municipal em circunstância similar, flagrado sem
máscara em área pública.
Ao receber o caso no CNJ, o corregedor pediu informações
sobre o histórico de Siqueira. Segundo o Tribunal de Justiça de SP, o
desembargador foi alvo de 40 procedimentos de apuração disciplinar nos últimos
15 anos – todos os processos foram arquivados.
O voto do relator
Relator do pedido, o corregedor Nacional de Justiça,
ministro Humberto Martins, afirmou no voto que o desembargador "agiu
usando das prerrogativas de seu cargo".
"São palavras que denotam autoritarismo, arrogância,
prepotência, vaidade. E o magistrado tem que ser imbuído de três grandes
qualidades: humildade, prudência e sabedoria. A sabedoria de saber que o limite
dele é a lei e a Constituição. Não existe autoridade acima da lei e da
Constituição."
“Ele [magistrado] não falou ali como cidadão, ele falou como
autoridade superior, agiu com muita prepotência, com muita arrogância, com
muito autoritarismo, fugindo às regras da boa convivência e das regras
estabelecidas, em primeiro lugar a defesa da vida e da saúde”, afirmou.
Segundo Martins, o guarda agiu com ética. "O policial
estava em defesa de quê? De garantir a saúde e a vida das pessoas. Mais de 110
mil pessoas atingidas pela Covid."
O corregedor afirma ainda que o desembargador não tem, a
princípio, condições de permanecer no exercício do cargo.
“É necessário o afastamento cautelar para que se investigue
o exercício das funções administrativas e jurisdicionais do desembargador,
porque durante seu período no tribunal, ele pode influenciar com relação a
outras condutas agressoras e que possa violentar a cidadania e possa ferir a
imagem da digna e honrosa magistratura do Brasil”, concluiu.
Ao fim da leitura do voto, o presidente do CNJ, ministro
Dias Toffoli, perguntou se alguém divergia da manifestação de Martins. Como
nenhum conselheiro se manifestou, o processo foi aberto por unanimidade.
Antes do início da votação, os advogados das partes também
apresentaram seus argumentos.
Flávio Bizzo Grossi, advogado da Frente Ampla Democrática
pelos Direitos Humanos, que apresentou o pedido de providências, disse que o
desembargador agiu de maneira que “infelizmente não é rara no nosso país, a
famosa carteirada”.
“‘Você sabe com quem você está falando?’ O Estado
constitucional não tolera essa prática espúria”, defendeu.
O advogado José Eduardo Alckmin, que representa o
desembargador, afirmou que o magistrado é cardíaco e precisa ir à praia fazer
caminhada por recomendação médica. E que o uso de máscara vem sendo
questionado. “Até o presidente da República entrou nessa discussão”,
argumentou.
O desembargador afirmou ao CNJ que foi vítima de
"armação" no episódio envolvendo guarda municipal em Santos e a multa
pelo não uso da máscara. Em nota após a divulgação do vídeo, Siqueira disse ter
sido vítima de uma "armadilha".
Punições possíveis
De acordo com a Lei Orgânica da Magistratura Nacional
(Loman), podem ser aplicadas ao final do procedimento penas como advertência,
censura, remoção compulsória, disponibilidade e aposentadoria compulsória
(estas duas últimas acompanhadas de vencimentos proporcionais ao tempo de
serviço).
Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostram que 104
magistrados foram punidos no país desde que o órgão foi instituído, em junho de
2005. Destes, 66 foram punidos com a pena máxima de aposentadoria compulsória,
com salário proporcional ao tempo de serviço – G1.
Carlos Magno
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