
Foto: Ton Molina/STF
A defesa de Marcelo Câmara, ex-assessor de Jair Bolsonaro,
entrou com um novo pedido no Supremo Tribunal Federal (STF) para anular o
acordo de delação premiada do ex-ajudante de ordens do ex-presidente,
tenente-coronel Mauro Cid.
O pedido foi encaminhado ao STF por meio da defesa prévia do
ex-assessor, um dos réus do Núcleo 2 da trama golpista. Os réus desse grupo são
acusados de organizar ações para “sustentar a permanência ilegítima” de
Bolsonaro no poder, em 2022.
Os depoimentos de Cid confirmaram o conteúdo de outras
provas obtidas durante as investigações da tentativa de golpe no final do
governo Bolsonaro para reverter o resultado das eleições de 2022 e impedir a
posse do vencedor, Luiz Inácio Lula da Silva.
Conversa
O advogado Eduardo Kuntz afirmou que foi procurado por Cid
no dia 29 de janeiro de 2023, por meio do perfil Gabrielar702, no Instagram.
Kuntz disse que já conhecia o militar e aceitou conversar
com ele porque achou que o assunto poderia ser uma possível contratação de seus
serviços.
Para confirmar que se tratava do ex-ajudante de ordens de
Bolsonaro, o defensor pediu que Cid enviasse uma foto.
Ao reconhecer o militar, a conversa se desenrolou, e o
advogado passou a perguntar se houve pressão para delatar e se os depoimentos
foram gravados.
Segundo o defensor, Mauro Cid aproveitou para
"desabafar" sobre os depoimentos de delação prestados à Polícia
Federal (PF).
Em uma das conversas, Cid disse ao advogado que os
investigadores da PF queriam "colocar palavras em sua boca". De acordo com o militar, os delegados
buscavam que ele falasse a palavra golpe.
“Várias vezes eles queriam colocar palavras na minha boca. E
eu pedia para trocar. Foram três dias seguidos. Um deles foi naquele grande
depoimento sobre as joias. Acho que foram cinco anexos. Eles, toda hora,
queriam jogar para o lado do golpe. E eu falava para trocar porque não era
aquilo que tinha dito. E eu fui bem claro lá. PR [Bolsonaro] não iria dar golpe
nenhum. Queria sempre me conduzir a falar a palavra golpe. Tanto que tive o
cuidado de não usar essa palavra", afirmou.
No entendimento de Eduardo Kuntz, a fala de Mauro Cid revela
que os depoimentos de delação não foram voluntários e devem ser anulados pelo
ministro Alexandre de Moraes, relator do processo da trama golpista.
"Sem embargos, nas palavras de desabafo do delator,
conforme se depreende desta conversa o princípio da voluntariedade foi
absolutamente arranhado, para não dizer que foi ferido de morte", afirmou.
Interrogatório
Na semana passada, ao ser interrogado por Alexandre de
Moraes, Mauro Cid foi perguntado pela defesa de Jair Bolsonaro se tinha
conhecimento dos perfis @gabrielar702 e Gabriela R, no Instagram, que são
identificados com o mesmo nome da esposa do militar, Gabriela Cid.
Ele respondeu que não sabia se o perfil era de sua esposa e
afirmou que não usou redes sociais para se comunicar com outros investigados.
Os advogados do ex-presidente levantaram a suspeita de que
Cid usou o perfil que seria da esposa para vazar informações de seus
depoimentos de delação.
Pelas cláusulas do acordo, os depoimentos são sigilosos, e o
descumprimento pode levar a penalidades, como a anulação dos benefícios, entre
eles, a possibilidade de responder ao processo em liberdade.
Após o interrogatório, a revista Veja também divulgou
mensagens de Mauro Cid e afirmou que o militar mentiu no depoimento prestado no
Supremo.
Defesa
Após a divulgação da reportagem, a defesa de Mauro Cid disse
que o texto da revista é "mentiroso". Os advogados também pediram a
investigação sobre a titularidade dos perfis.
"Esse perfil não é e nunca foi utilizado por Mauro Cid,
pois, ainda que seja coincidente com nome de sua esposa (Gabriela), com ela não
guarda qualquer relação", afirmou a defesa.
Anulação
Mais cedo, Moraes negou pedido da defesa de Bolsonaro para
anular a delação de Mauro Cid. O ministro entendeu que o momento processual não
é adequado para analisar a anulação do acordo. Além disso, Moraes disse que o
mesmo pedido foi negado diversas vezes durante a tramitação do processo.
André Richter/Nádia Franco – Agência Brasil