O Conselho Estadual de Direitos Humanos da Paraíba (CEDH-PB)
emitiu uma nota pública repudiando a postura dos policiais envolvidos na
operação que resultou em oito mortes na cidade de Barra de São Miguel, a 175 km
de João Pessoa. Em nota emitida no domingo (07), o CEDH-PB, sem entrar no
mérito da operação, afirmou que a cena excedeu todas as raias da legalidade,
tendo sido transformada “em um espetáculo macabro de manipulação e exibição de
cadáveres, em total desacordo com as regras de conduta da atividade policial”.
No dia 2 de julho, oito suspeitos de integrarem uma
quadrilha de assalto a estabelecimentos bancários foram mortos em um confronto
com a Polícia Militar de Pernambuco e da Paraíba. A quadrilha havia assaltado
uma lotérica na cidade de Santa Cruz do Capibaribe, no estado vizinho, e matado
um policial militar pernambucano na fuga. O grupo tentou se esconder na
Paraíba, mas foram localizados e morreram durante a operação em Barra de São
Miguel.
Os oito mortos no confronto com a polícia, sendo duas
mulheres e seis homens, foram despidos e seus corpos foram empilhados. Em
seguida, os corpos foram colocados em viaturas policiais e apresentados em via
pública. O fato foi filmado por moradores de Barra de São Miguel e publicado em
redes sociais e aplicativo de trocas de mensagens.
“Cenas de gelar o sangue, tais como cadáveres sendo despidos
(com que finalidade? humilhação post-mortem?), carreata com cadáveres jogados
na caçamba de caminhonete, corpos empilhados um sobre o outro como troféus em
uma guerra tribal, cadáveres sendo alvejados por disparos inúteis foram
amplamente divulgadas nas redes sociais dos Estados de Pernambuco e Paraíba,
mediante filmagens de populares e até mesmo possivelmente de policiais, sendo
certo que tais vídeos não poderiam ter sido produzidos sem o consentimento e a
tolerância dos agentes policiais participantes da operação”, afirma a nota.
Por fim, a nota assinada por Guiany Campos Coutinho,
presidente do CEDH-PB, pede que as secretarias de segurança da Paraíba e de
Pernambuco “adotem todas as providências necessárias para evitar a repetição de
espetáculos dessa ordem que enodoam todo e qualquer mérito das ações policiais
em defesa da segurança pública”. O documento finaliza se solidarizando com a
morte do policial militar pernambucano e dos oito suspeitos.
Indignação da
população
O secretário de segurança da Paraíba, Jean Francisco Nunes,
havia afirmado na sexta-feira (3) que os corpos foram colocados em viaturas com
objetivo de serem levados a postos de saúde. Sobre os vídeos e a reação dos
moradores de Barra de São Miguel, Jean Francisco Nunes explicou que foi apenas
o reflexo da indignação da população brasileira diante da criminalidade,
principalmente nos crimes patrimoniais.
Na ocasião, Jean Nunes afirmou que, para fins estatísticos,
a Paraíba assumiu as oito mortes dos suspeitos pernambucanos por terem
acontecido em solo paraibano. Ele comentou que, além de contabilizar mais oito
mortes violentas no Programa Paraíba Unida Pela Paz, as mortes são registradas
como em decorrência de intervenção policial da Paraíba, embora, o confronto
tenha sido entre os suspeitos e os policiais pernambucanos.
Ainda segundo o secretário, as circunstâncias das mortes dos
suspeitos estão sendo apuradas em inquéritos pela Polícia Civil da Paraíba. “Na
terça-feira foram feitas várias perícias no local das mortes, no cenário, o que
é normal, porque toda cena temos que fazer a perícia, exames. Foi aberto o
procedimento na Paraíba, assim como em Pernambuco. Essa apuração vai para o
judiciário, seguir o trâmite normal”, comentou o secretário de segurança.
Apesar disso, Jean Francisco Nunes garante que a operação
integrada entre os dois estados foi exitosa, pois, embora tenham gerado oito
mortes, tirou de circulação uma quadrilha ligada a crimes como assaltos,
latrocínios e homicídios.
“Esse grupo iria continuar a agir na Paraíba, poderia tirar
as vidas de outras pessoas, como tirou a vida de um policial e deixou outro
ferido. Quanto mais a gente conseguir tirar de circulação prendendo essas
pessoas, melhor. Se partirem para o confronto, a polícia não vai recuar”,
comentou – G1.
Veja a nota, na íntegra:
O CONSELHO ESTADUAL DE DIREITOS HUMANOS DA PARAÍBA vem por
meio dessa nota pública externar seu repúdio e sua profunda preocupação com a
forma pela qual se portaram os agentes policiais do Estado da Paraíba e do
Estado de Pernambuco, após a cena do confronto que resultou em oito mortos na
cidade de Barra de São Miguel-PB.
Sem entrar no mérito da ação policial em si, entende este
órgão colegiado que o tratamento da cena do embate, transformado literalmente
em um espetáculo macabro de manipulação e exibição de cadáveres, em total
desacordo com as regras de conduta da atividade policial, excedeu todas as
raias da legalidade.
Efetivamente, a cena do confronto exigia preservação, para
fins do trabalho necessário da perícia criminal, e afastamento do público, a
fim de evitar a sempre nociva divulgação e exploração de cenas mórbidas de
morte e mutilação. Muito pelo contrário, testemunhou-se no local atos
incompatíveis com a atividade policial, e que se prestaram unicamente para
denegrir e rebaixar as instituições policiais diante da sociedade civilizada
que ainda preza pelo respeito às leis e à dignidade humana, que impõem o
respeito no tratamento dos mortos, por pior que possa ter sido o ato por eles
cometido.
De fato, cena de crime não é lugar para discurso público
sobre a criminalidade ou busca de apoio popular, diante dos cadáveres tombados.
Tal ato resvala na demagogia. Cenas de gelar o sangue, tais como cadáveres
sendo despidos (com que finalidade? humilhação post-mortem?), carreata com
cadáveres jogados na caçamba de caminhonete, corpos empilhados um sobre o outro
como troféus em uma guerra tribal, cadáveres sendo alvejados por disparos
inúteis foram amplamente divulgadas nas redes sociais dos Estados de Pernambuco
e Paraíba, mediante filmagens de populares e até mesmo possivelmente de
policiais, sendo certo que tais vídeos não poderiam ter sido produzidos sem o
consentimento e a tolerância dos agentes policiais participantes da operação,
cujos comandantes, aparentemente, procuraram atrair o público daquela urbe
interiorana para o espetáculo macabro, ao invés de afastá-lo, como seria seu
dever.
Tal cenário, nada distante do culto ao sangue do antigo
Coliseu de Roma, concorre não para o fortalecimento, mas para o descrédito da
atividade policial, transformada, pelo tratamento absurdo da cena do crime, em
um grotesco ato de vingança selvagem, a anos-luz de distância da ideia de uma
ação policial racional, eficiente e planejada, como acreditamos ter sido o
propósito da atuação das autoridades da segurança pública pernambucanas e
paraibanas.
Assim sendo, o CEDH-PB insta às Secretarias de Segurança do
Estado da Paraíba e Pernambuco a investigarem rigorosamente estes fatos,
punindo devidamente os responsáveis, e mais do que isso, adotem todas as
providências necessárias para evitar a repetição de espetáculos dessa ordem que
enodoam todo e qualquer mérito das ações policiais em defesa da segurança
pública.
Contudo, este Conselho lamenta e se solidariza com a
corporação policial pela morte de um de seus membros. Também, igualmente,
lamenta e se solidariza com os familiares das pessoas que perderam suas vidas
em tão horrenda ação.
João Pessoa, 7 de julho de 2019
GUIANY CAMPOS COUTINHO
PRESIDENTE DO CEDH
Carlos Magno
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