O avanço do coronavírus e a consequente paralisação das
atividades jogaram luz nos ditos invisíveis, mostrando que mais de 50 milhões
de pessoas enquadram-se em uma realidade antes desconhecida. O auxílio
emergencial, fundamental para que o tombo da economia não fosse tão drástico,
foi prorrogado por dois meses, mas o governo trabalha para dar continuidade ao
auxílio dos vulneráveis por mais tempo.
A forma de pagar essa conta, entretanto, é a grande
incógnita. Por isso, o governo prepara um pedido nababesco para entidades
internacionais, de cerca de 20 bilhões de reais para bancar o Renda Brasil,
programa gestado no Ministério da Economia para unificar a assistência social e
distribuição de renda no país.
A informalidade mostrou-se mote de um país com dimensões
continentais e o problema, gravíssimo. O Brasil, de fato, não estava preparado
para ser assolado pela doença. O Ministério da Economia e o Congresso Nacional,
vale dizer, agiram rápido para garantir a subsistência dos mais vulneráveis e a
manutenção de negócios e empregos, por meio da medida provisória que prevê a
suspensão de contratos, redução de salários e a consequente cobertura dos
vencimentos por parte do governo. Longeva, a pandemia arrefece de forma muito
mais lenta do que o esperado pela equipe econômica — não só por fé ou mandinga,
mas pela capacidade de dar continuidade aos programas.
O auxílio emergencial foi a bala de prata para manter a
economia do país respirando. Assim como necessários para evitar a fome e as
mínimas condições, os 600 reais, porém, são, de longe, o programa mais caro
engendrado pelo poder público. O custo total ultrapassa os 250 bilhões de
reais. Enquanto renasce a ideia de tornar o pagamento de um auxílio de forma
permanente, o governo corre para garantir a viabilidade dos pagamentos. Nos
bastidores do Ministério da Economia, discute-se algo entre 200 e 300 reais.
Mesmo com a redução do valor, o problema está em como pagar essa conta.
Na segunda-feira 27, o ministro Paulo Guedes levou as
preocupações ao presidente Jair Bolsonaro, e explicou que a estratégia de
comunicação do governo será vender o projeto que estipula um novo imposto nos
moldes da CPMF como forma de financiar o auxílio e a nova política de proteção
social de forma permanente. O projeto deve ser entregue em 15 de agosto e faz
parte das fases da reforma desejada pelo executivo.
Consequentemente, o ministro espera entregar um projeto
conciso de renda básica, na ressaca do fim dos pagamentos, também em meados do
mês que vem. Mas, o governo precisa de dinheiro para o auxílio operar enquanto
os projetos tramitam pelo Congresso. Por isso, o ministro preparou um pedido de
nababescos 4 bilhões de dólares, mais de 20 bilhões de reais, para entidades
internacionais para financiar a extensão dos benefícios elevados a primordiais
graças à pandemia.
O Ministério da Economia levará o pedido à Comissão de
Financiamento Externo, a Cofiex, um grupo formado por diversas esferas do
Executivo para discutir os pedidos de recursos para bancos e entidades
internacionais. Na solicitação, que será discutida na quinta-feira 29, o
governo preparou uma carta-consulta para a continuidade do programa emergencial
de emprego e renda.
“O objetivo geral do projeto é contribuir e assegurar níveis
mínimos de qualidade de vida às pessoas em vulnerabilidade frente à crise do mercado
laboral”, disserta o pedido. Apoiar com recursos financeiros a manutenção de
níveis mínimos de renda para pessoas impactadas pelos efeitos econômicos da
pandemia da Covid-19, que estejam no setor informal ou sejam trabalhadores
independentes”, escrevem os membros da equipe econômica. O pedido é
destrinchado, então, por valores.
Segundo o documento, ao qual VEJA teve acesso, 1,7 bilhão de
dólares, cerca de 8,8 bilhões de reais, seriam utilizados para o financiamento
do programa de amparo aos mais vulneráveis, como os informais, como o auxílio
emergencial. Outros 960 milhões de dólares, ou quase 5 bilhões de reais, seriam
destinados à ampliação do programa Bolsa Família, um dos pilares para a nova
política de proteção social.
Para um programa de proteção de empregos por meio da
assunção de parte dos pagamentos das folha salarial, o governo solicita 550
milhões de dólares e também pede outros 780 milhões de dólares para a expansão
dos valores disponíveis para o pagamento do seguro-desemprego. As solicitações
serão feitas ao Banco Interamericano de Desenvolvimento, ao Banco Mundial, ao
Banco dos Brics, e a agências de fomento internacionais (veja a imagem acima).
É de se lembrar a ironia do expoente liberal Milton Friedman (1912-2006):
“Ninguém gasta o dinheiro dos outros com tanto cuidado como gasta o seu
próprio”.
Agronegócio
Na mesma reunião onde Guedes passará o chapéu, o Ministério
da Agricultura, comandado por Tereza Cristina, também pleiteia recursos. A
pasta apresentará um pedido para o Banco Mundial de 200 milhões de dólares,
cerca de 1 bilhão de reais, ao Banco Mundial para o Programa de Desenvolvimento
Sustentável da Agropecuária da Amazônia, o Agronorte, e de outros 230 bilhões
de dólares para a consolidação do similar no Nordeste, o Programa de Apoio ao
Desenvolvimento Agropecuário no Nordeste, o AgroNordeste.
No primeiro, a carta-consulta destrincha o pedido como
necessário para a “implantação de políticas públicas voltadas para a
regularização fundiária e ambiental e para implementação de práticas produtivas
para acesso a novos e melhores mercados, com foco no fomento à produção rural
sustentável, sendo a combinação de regularização e incremento da renda do
produtor”, fatores considerados por ela “fundamentais para a desaceleração do
desmatamento”.
O pedido, argumenta, seria cerne para a consolidação de um
projeto de desenvolvimento da região amazônica, buscando o desenvolvimento de
linhas de transmissão de energia e comunicação, por exemplo, para as cidades
que ocupam as florestas. A medida, argumenta, seria para “assegurar que as
margens das estradas e ferrovias sejam priorizadas na regularização fundiária e
ambiental, e que o mesmo tratamento seja dado as áreas de garimpo”. “Tanto
margens de estradas quanto áreas de exploração mineral são sujeitas a intensa
pressão de desmatamento”, escreve a ministra.
“A partir da solução dos problemas fundiários, de
transporte, energia existem as condições para que ocorra um desenvolvimento
econômico sustentável”, argumenta a carta de 34 páginas destinada ao Banco
Mundial. “Ao não investir para resolver problemas estruturantes o Brasil
continuará a ter sua imagem atacada por movimentos ambientalistas dentro e fora
do país”, apela à boa vontade da instituição. “Investidores que hoje já indicam
ter dificuldades em apostar no Brasil cumprirão suas ameaças e as exportações
brasileiras do agronegócio, hoje responsáveis por quase 50% em valor sofreram
boicotes além do que já estão encontrando. O acordo comercial com a União
Europeia e outros em discussão serão engavetados”, revela sua preocupação,
antes de culpar os governos anteriores pela grave situação do desmatamento na
Amazônia.
“Finalmente, é importante lembrar que a situação atual é
resultado de políticas equivocadas de governos anteriores, que entre 1997 e
2015 assentaram 600 mil famílias na região, além de incentivar outros milhares.
Foram investidos bilhões de reais anualmente para chegar à situação atual, que
não irá ter solução sem políticas e ações para resolver os problemas atuais”,
escreve, sem citar que a devassa nas florestas registrou aumento de 51% entre
janeiro e março em relação ao mesmo período de 2019, segundo o Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Depois de dissertar sobre os índices de preservação das
florestas e bater na tecla, vem o apelo: “Não basta regularizar, é necessário o
fomento ao desenvolvimento local, à geração de renda e à melhoria da qualidade
de vida da população amazônida, pautado na valorização dos produtos locais e
remuneração pelos serviços ambientais prestados globalmente por este
território, seja por meios de incremento no valor mínimo do produto ou por meio
de instrumentos de mercado para pagamento dos serviços ambientais”. “É
necessário desenvolver outros negócios sustentáveis na região”, argumenta o pedido.
O destino da dinheirama é discriminado pelo pedido. Do
total, 150 milhões de dólares seriam utilizados para regularizar os imóveis na
região, mais de 45 mil propriedades no Cadastro Ambiental Rural (CAR), segundo
o documento. Outros 64,5 milhões para fomentar o “aumento de oportunidades
econômicas na região”, entre outras propostas, para conceder área de terras
públicas para “exploração sustentável” da floresta e desenvolver assentamentos.
Segundo a carta, os recursos seriam capazes de frear a degradação ambiental da
região, por meio do desenvolvimento econômico. “Esse potencial pode ser medido
pelo grau de acesso ao mercado, conectividade, conhecimento e experiência
agrícola”, disserta Tereza Cristina e a Secretaria de Assuntos Econômicos
Internacionais, lotada sob o guarda-chuva de Paulo Guedes.
No caso do AgroNordeste, o governo argumenta que os recursos
seriam necessários para viabilizar ações de regularização fundiária e ambiental
de propriedades e a consolidação de assentamentos da Reforma Agraria para
“promover o desenvolvimento agropecuário do Nordeste, mediante o aumento da
competitividade de cadeias e clusters produtivas promissoras com base em ações
concentradas nos territórios selecionados”. Segundo o pedido, os recursos
seriam destinados também a melhorar as condições sanitárias das atividades
agropecuárias, especialmente para a produção de frutas na região. Da
dinheirama, 107,5 milhões de dólares seriam utilizados para a regularização dos
assentamentos, vista como fundamental pelo governo para conseguir punir os
desmates ilegais a partir da dotação dos reais donos das terras.
Nos últimos meses, Tereza Cristina vem repetindo aos quatro
cantos que não é necessário desmatar a Amazônia, e convocou seus auxiliares para
realizar uma série de campanhas para mostrar a qualidade do agronegócio
brasileiro — e o quão longe as produções estão das florestas. O vice-presidente
Hamilton Mourão, que apinha o cargo com o de presidente do Conselho Amazônia,
recebeu na semana passada os presidentes dos três maiores bancos do país e
ouviu dos cabeças de Itaú, Bradesco e Santander a disposição para ajudar no
périplo, em busca de uma melhora na imagem. O ministro do Meio Ambiente,
Ricardo Salles, por sua vez, faz voto de silêncio. Isso tudo depois de os três
arquitetarem, como mostrou VEJA, os planos para acalmar os ânimos de
investidores estrangeiros com o intermédio do presidente do Banco Central,
Roberto Campos Neto – Veja.
Carlos Magno
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