O relator da CPI da Covid, Renan Calheiros (MDB-AL), listou
o que para ele foram as "mentiras" contadas pelo ex-ministro da Saúde
Eduardo Pazuello na CPI da Covid. Pazuello deu depoimento em dois dias, nestas
quarta (19) e quinta (20).
Senadores da oposição se indignaram com os momentos em que,
segundo eles, Pazuello deixou de apresentar a verdade sobre a condução da
pandemia pelo governo.
O relator anunciou que pretende contratar uma agência de
checagem para apurar as declarações feitas pelos depoentes à comissão. Renan
afirmou que vai encaminhar um relatório preliminar ao Ministério Público para
que seja apurado se houve omissões nos depoimentos.
Vejas as
"mentiras" listadas por Renan:
Ordens do presidente
Na quarta-feira (19), Pazuello foi questionado se a nomeação
dele no Ministério da Saúde se deu sob a condição de cumprimento de alguma
ordem específica, entre elas a recomendação de tratamento precoce com
cloroquina ou outro medicamento.
O ex-ministro respondeu: “Em hipótese alguma. O presidente
nunca me deu ordens diretas para nada”.
O relator, porém, ressaltou vídeo divulgado por Jair
Bolsonaro em outubro do ano passado. Ao lado do presidente, um dia após ter
sido desautorizado a fechar contrato para a aquisição da CoronaVac, o
ex-ministro afirmou: “É simples assim: um manda e outro obedece".
“Aqui, tenta justificar que o que se fala em redes sociais
são falas políticas, que não correspondiam a sua ação. Se essa desculpa pudesse
prevalecer, seria impossível a esta CPI avaliar as ações do Ministério e do
Governo, que são o principal objeto desta CPI, pois as declarações públicas não
serviriam de nada e, como Vossa Excelência respondeu várias vezes ontem, não
havia produção de documentos”, afirmou o relator.
Divulgação do
aplicativo TrateCov
Também na quarta, o ex-ministro afirmou que o aplicativo
TrateCov, plataforma que prescrevia o chamado tratamento precoce, não chegou a
ser distribuída aos médicos. “A plataforma nunca entrou em operação”, disse
Pazuello.
A plataforma previa o tratamento a pacientes que têm
sintomas que podem ou não ser da Covid-19 O "tratamento" indicado
incluía medicamentos que, segundo demonstraram diferentes estudos, não
funcionam contra a doença, como a cloroquina, a hidroxicloroquina e a
azitromicina.
Calheiros ressalta, porém, que o aplicativo foi lançado pelo
Ministério da Saúde no dia 11 de janeiro, durante evento em Manaus. O
lançamento da plataforma foi noticiado na TV Brasil.
Na quinta, ao ser novamente questionado sobre o aplicativo,
Pazuello afirmou que um hacker vazou o conteúdo.
Limitação do STF
Logo em sua fala inicial, o ex-ministro afirmou que decisão
do Supremo Tribunal Federal (STF) limitou a atuação do governo na pandemia e
que não havia “a possibilidade de o Ministério da Saúde interferir na execução
das ações dos estados na saúde sem usurpar as competências dos estados e
municípios”.
O relator, no documento, rebate a declaração: “Em nenhum
momento o Supremo proibiu ou limitou ações federais. A decisão na Ação de
Direta de Inconstitucionalidade nº 6341 permite que estados e municípios tomem
suas medidas, mas não impede que o Ministério da Saúde tome as suas. O STF diz
que o entendimento foi reafirmado pelos ministros em diversas ocasiões”.
Ranking de imunização
À CPI, Pazuello afirmou que o Brasil figura entre os países
que mais imunizaram no mundo. “Ficamos atrás apenas de Estados Unidos, China e
Índia”, disse.
“A informação visa a confundir. Não faz sentido comparar
números absolutos. O que importa é imunização percentual, ou seja, quantos por
cento da população receberam a vacina. Além disso, começamos a vacinar no final
de janeiro, quando poderíamos ter começado em dezembro do ano passado, como
tantos países conseguiram. Nosso ritmo é um dos mais lentos do mundo”, avalia o
senador.
Atuação da cloroquina
O ex-ministro da Saúde também declarou que a cloroquina “é
um antiviral e um anti-inflamatório conhecido pelo Brasil”. “Pelo menos é o que
me é trazido, eu não sou médico”, acrescentou.
“A cloroquina não é um antiviral nem um anti-inflamatório, e
sim um antimalárico, utilizado no combate ao plasmódio da malária, que é um
protozoário”, pontuou Renan.
Na sessão, o senador Otto Alencar (PSD-BA), que é médico,
também advertiu Pazuello.
Cloroquina contra o
zika vírus
Sobre o remédio, Pazuello também afirmou que em 2016, na
crise do zika vírus, a cloroquina foi utilizada e colocada como protocolo pelo
Ministério da Saúde. “Cloroquina em altas doses – isso para grávidas”,
reforçou.
Segundo o relator, “nunca houve administração de cloroquina
para pacientes contaminados pelo Zika vírus”.
“Iniciou-se uma pesquisa em ratos, com resultados que não se
replicaram em humanos. Por isso, a pesquisa foi interrompida. Além disso, o
zika vírus não é semelhante ao coronavírus. A afirmação servia para confundir,
para tentar passar uma ideia de versatilidade à cloroquina e, assim, tentar
justificar seu uso para outras doenças”, afirmou Calheiros.
Impeditivos legais
para a vacina
O relator também questiona a declaração de Pazuello de que o
governo não teria como comprar a vacina da Pfizer sem a autorização do
Congresso.
Renan destaca que, à época das primeiras tratativas, o então
ministro e o presidente reclamavam das cláusulas da Pfizer, mas não citavam a
necessidade de uma lei.
“Ao contrário, retiraram esse dispositivo do anteprojeto da
Medida Provisória 1.026. Vossa Excelência disse que não sabe por que o governo
fez isso e que não foi decisão do ministério. Ainda assim, afirma que a Presidência
não tinha ingerência sobre sua gestão. A alteração legislativa veio de um
projeto do Senado. O governo, que tinha a iniciativa legislativa, nada fez”,
pontua o relator.
CoronaVac
Pazuello disse que Jair Bolsonaro “nunca” determinou que ele
desfizesse qualquer contrato ou acordo com o Instituto Butantan para a
aquisição da CoronaVac. “Nunca houve a ordem” (...) “Uma postagem na internet
não é uma ordem”, afirmou.
Em outubro, o próprio presidente afirmou, porém, que havia
mandado cancelar o protocolo de intenções. “O presidente sou eu, não abro mão
da minha autoridade. Até porque estaria comprando uma vacina que ninguém está
interessado por ela, a não ser nós", disse Bolsonaro.
À CPI, o ex-ministro disse que a declaração não representava
uma ordem de cancelamento, mas somente uma “posição política”
“O Presidente do Butantan, Dimas Covas, antes mesmo do
depoimento de Vossa Excelência, fez questão de enviar ofício para esta Casa,
afirmando que, após a contraordem do Presidente da República, em outubro de
2020, houve uma completa paralisação do processo de negociação, só sendo
realmente assinado em 7 de janeiro de 2021”, escreveu Renan.
Tratamento precoce
Apesar de o ex-ministro ter dito que não haveria a
possibilidade de o Ministério da Saúde interferir na execução das ações de
estado da saúde, o relator apontou que Pazuello, em evento com Bolsonaro no dia
11 de janeiro, confirmou a atuação pelo tratamento precoce.
“Você entrou com o tratamento precoce em Manaus, não
entrou?”, perguntou Bolsonaro ao então ministro.
"Já está funcionando com a nova gestão”, respondeu
Pazuello.
Colapso no oxigênio
Sobre o colapso do oxigênio hospitalar em Manaus, Pazuello
afirmou que ele fora alertado da situação apenas na noite do dia 10 de janeiro.
Ele reforçou ainda que no dia 13 de janeiro houve uma queda de 20% na demanda e
no consumo e que no dia 15 o estoque voltou a ser positivo.
Renan pontuou que faltou oxigênio em Manaus por mais de 20
dias.
“Ofício que a Advocacia-Geral da União enviou ao Supremo
Tribunal Federal (STF) em janeiro afirma que o governo federal sabia do
“iminente colapso do sistema de saúde” do Amazonas dez dias antes de a crise
estourar e faltar oxigênio para pacientes no estado”, disse o relator.
Covax Facility
Já sobre a adesão da menor quantidade de doses de vacina
oferecida pelo consórcio Covax Facility, o ex-ministro disse que “estar
presente no consórcio era mais importante" do que a aquisição de um número
elevado de imunizantes no primeiro momento.
Ele reforçou que se houvesse uma aceleração de entrega,
seria possível comprar mais vacinas em um segundo momento.
“A informação não condiz com a realidade. O consórcio era
capitaneado pela OMS, praticamente todos os países já haviam aderido e o
Brasil, naquele momento, não tinha perspectiva de outras contratações que
justificasse a reserva de valor tão pequeno de doses da vacina”, ressaltou
Renan.
Veto à Pfizer
O ministro afirmou que órgãos de controle, entre eles o
Tribunal de Contas da União (TCU), deu orientação contrária à assinatura do
contrato de compra de vacina da Pfizer.
Após a declaração, o TCU publicou nota de esclarecimento
dizendo que “nenhum de seus ministros se posicionaram de forma contrária à
contratação da empresa Pfizer”.
Produção de
cloroquina pelo Exército
Segundo Renan, Pazuello "afirmou desconhecer que a
produção de cloroquina para Covid pelo Exército tenha passado pelo Ministério
da Saúde".
Para o relator, o "Ministério da Defesa informou
textualmente que foi o Ministério da Saúde que determinou a produção de
cloroquina pelo Laboratório Químico e Farmacêutico do Exército".
Pressão
pró-cloroquina
Pazuello disse na CPI que não sofreu pressão do presidente
Jair Bolsonaro para estimular o uso de cloroquina. Renan lembrou que os dois
antecessores de Pazuello, Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, afirmaram que
sofreram pressão. Para Renan, é "inverossímil" que o mesmo não tenha acontecido
com Pazuello.
"Contraditoriamente, o depoente quis convencer a
Comissão de que ele, justamente o único que não tinha qualquer formação médica,
foi o único que não sofreu qualquer pressão, orientação ou determinações do
Presidente da República. Essa declaração é absolutamente inverossímil
considerando os outros depoimentos e as condições de sua chegada ao
ministério", afirmou Renan.
Plano de contingência
O relator contesta relatos de Pazuello sobre o plano
nacional de contingência contra a pandemia.
De acordo com o Renan, diante dos resultados
"pífios" do plano e de uma cobrança do Tribunal de Contas da União
(TCU), o ministério, em vez de melhorar a execução, trocou palavras no projeto
para facilitar a meta. Onde havia, por exemplo, a palavra "garantir",
entrou "apoiar".
"O depoente não explicou por que foi feita alteração do
normativo após a notificação do TCU, tendo ficado claro que o movimento foi
para driblar as ordens da autoridade de controle. Evidentemente o TCU não se
deixou enganar e já está investigando a manobra", explicou Renan – G1.
Carlos Magno
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