No seu 52º dia de atividade, a CPI da Pandemia já tem a
primeira lista de 14 nomes de testemunhas que passarão à condição de
investigados. Entre eles, estão o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga; seu
antecessor na pasta, Eduardo Pazuello; e o ex-ministro das Relações Exteriores
Ernesto Araújo.
Também estão na relação o ex-secretário-geral do Ministério
da Saúde Antônio Elcio Franco Filho; a secretária de Gestão do Trabalho da
Saúde, Mayra Pinheiro; a coordenadora-geral do Programa Nacional de Imunizações
(PNI), Francieli Fontana Fantinato; o secretário de Ciência, Tecnologia,
Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde, Hélio Angotti Neto; o ex-assessor do
presidente da República Arthur Weintraub; o ex-secretário de Comunicação da
Presidência da República Fabio Wajngarten; e o ex-secretário de Saúde do
Amazonas Marcellus Campêlo.
Compõem a lista ainda nomes que são apontados como membros
do “gabinete pararelo” de assessoramento ao presidente da República Jair
Bolsonaro: o empresário Carlos Wizard Martins, a médica Nise Yamaguchi, o
médico Paolo Zanotto e o tenente-médico da Marinha Luciano Dias Azevedo.
Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado
A lista foi divulgada pelo relator da CPI, Renan Calheiros
(MDB-AL), em entrevista coletiva nesta sexta-feira (18). O senador afirmou que
novos nomes poderão ser inseridos semanalmente e que “respostas precisam ser
dadas com relação ao número de mortes que poderiam ter sido evitadas”.
— Temos a transformação de algumas pessoas que estiveram na
CPI prestando depoimentos como testemunhas, na sua reclassificação para
investigados. Esse é um momento importante da investigação. Com relação a essas
pessoas, contra as quais já acessamos provas e indícios, precisamos mudar o
patamar da investigação — expôs o relator.
Isso é bom para a investigação e bom também para a segurança
jurídica do próprio investigado, segundo o senador, porque a partir da
declaração dessa condição, os investigados passam a ter direito a informações e
acesso às provas e aos indícios que estão sendo juntados no processo
investigatório:
— Do ponto de vista dos depoimentos, não [é bom para a
investigação]. Sempre vamos ter mais facilidade para ouvir as pessoas como
testemunha, porque o próprio Supremo Tribunal Federal (STF) tem encaminhamentos
diferentes com relação ao depoimento do investigado e ao depoimento da
testemunha.
Depoimentos
A maior parte dos investigados já prestou depoimento à CPI,
sendo esse um dos critérios para a definição da relação dos nomes, de acordo
com o relator. Na lista está o atual ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, que
prestou depoimentos ao colegiado nos dias 6 de maio e 8 de junho.
— Colocamos o ministro Queiroga, que teve uma participação
pífia na CPI no seu primeiro depoimento, quando tentou dizer que teria a
autonomia que faltou a Nelson Teich e a Luiz Henrique Mandetta. Os fatos logo
demonstraram o contrário: ele defendeu a vacinação, e o presidente [Jair
Bolsonaro], no dia seguinte, disse que iria lhe encomendar um decreto para
minimizar a utilização das máscaras.
Pesam ainda contra o ministro, segundo Renan, o fato de lote
de vacina, cuja negociação foi comandada por Queiroga, ter sido adquirido 20%
mais caro que o contrato anterior. Renan cita ainda outro motivo:
— Em abril, acessamos documento em que Queiroga, em conversa
com o diretor-presidente da OMS [Organização Mundial da Saúde], cobra agilidade
no fornecimento das vacinas e recebe “um puxão de orelha”. O diretor-presidente
questionou a cobrança, porque quando a OMS disponibilizou a aquisição de
vacinas para 50% da população brasileira, postergaram e assinaram o mínimo de
10%.
Segundo Renan, Queiroga aproveitou a conversa e defendeu no
contato com a OMS o “tratamento precoce”, com prescrição da cloroquina, e teria
“mentido” novamente dizendo que no Brasil esse tratamento tinha apresentado
eficácia de 70%.
Entre os atuais ou ex-integrantes do governo, compõem a
lista dos que testemunharam à CPI Fabio Wajngarten, ouvido em 12 de maio;
Ernesto Araújo, que falou ao colegiado no dia 18 de maio; Eduardo Pazuello, que
depôs munido de habeas corpus nos dias 19 e 20 de maio; Mayra Pinheiro, que
esteve diante dos senadores em 25 de maio; Antônio Elcio Franco Filho, ouvido
no dia 9 de junho, e, por último, e Marcellus Campêlo, que compareceu no
dia 15 de junho.
Francieli Fontana Fantinato, Hélio Angotti Neto e Arthur
Weintraub ainda não foram ouvidos na CPI. Do suposto “gabinete pararelo”, só
foi inquirida pelos senadores a médica Nise Yamaguchi, que compareceu à CPI no
dia 1º de junho.
Nesta quinta-feira (17), os senadores aguardavam a presença
do empresário Carlos Wizard, que não compareceu, apesar de ter obtido liminar
no STF para permanecer calado. Fecham a lista de investigados os médicos Paolo
Zanotto e Luciano Dias Azevedo.
O relator explicou que alguns não foram ouvidos porque a CPI
teve dificuldade para encontrá-los, caso de Wizard e Weintraub, que estariam no
exterior.
— A CPI não vai aceitar esse enfrentamento. Temos poderes
constitucionais, judiciais e de polícia para tanto. Não comparecer a um
depoimento, como fez Wizard e está tentando fazer Arthur Weintraub, significa
enfrentar a instituição.
Terceira fase
A CPI entra agora em uma terceira fase de investigações. O
colegiado já tem por certo que houve cumplicidade criminosa entre agentes
privados e públicos para favorecimento.
— Uma "perna" disso é a atuação, inclusive com
crimes de advocacia administrativa, em favorecimento de empresas privadas. Quem
foi beneficiado: é nessa seara que começaremos a entrar nesta semana — explica
o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP).
Mais da metade das vertentes das investigações já estão
comprovadas, segundo Renan.
— Nós já ouvimos 29 depoentes. Temos documentos,
testemunhos, vídeos e muitas provas. Temos ainda prazos e outras linhas da
investigação que precisam ser levados a cabo — afirmou que Renan, ao
complementar que a CPI tem aprovação de 60% da população brasileira.
Entre informações a serem investigadas, está a atuação da
rede de hospitais federais no Rio de Janeiro, conforme depoimento prestado
nessa quarta-feira (16) à CPI pelo ex-governador do estado Wilson Witzel.
— Não sabemos ainda se são totalmente verdadeiras as
informações de que há ali um grande negócio que se perpetua no tempo, em
detrimento da saúde dos cariocas — disse Renan.
Habeas corpus X STF
O relator explicou que a CPI aguarda a decisão do STF para
definir a competência ou não do colegiado para investigar os governadores de
estado. Dessa forma, mesmo diante das evidências do caos vivido em Manaus,
não há como inserir ainda o governador do Amazonas, Wilson Lima, na lista de
investigados, segundo Renan. O gestor estadual obteve habeas corpus no
Supremo para não comparecer diante dos parlamentares no dia 10 de junho.
— Aguardamos a decisão do STF para que possamos avançar ou
não sobre essas investigações, sobretudo sobre essa [do Amazonas], porque o
estado é um fato determinado de investigação da CPI.
Randolfe complementou que essa não é uma questão de
conteúdo, mas de forma.
— As autoridades do Amazonas já constam como investigadas,
mas tem o impasse no âmbito do STF. Ao passo que a Suprema Corte concluir que é
competência da CPI avançar sobre os governadores, isso será incluído na
condução das investigações.
Assim como o gestor do Amazonas, outros oito governadores
convocados pela CPI acionaram o STF para pedir a suspensão de "qualquer
ato da CPI da Pandemia referente à convocação para depoimento de governadores
de estado e do Distrito Federal". A relatora também é a ministra Rosa
Weber, que ainda não se manifestou sobre esse pedido.
— Com relação às decisões do STF, tanto para o deferimento
das quebras de sigilo dos investigados quanto com relação ao comparecimento ou
não para os depoimentos, estamos plenamente satisfeitos. Elas não colocam
dificuldades à investigação — pondera Renan.
O STF também possibilitou esclarecer, segundo o relator, que
as testemunhas obrigadas a comparecer devem responder sobre fatos de que tenham
conhecimento, apesar de não serem obrigadas a falar sobre aqueles que as
incriminem (caso obtenham habeas corpus para isso) – Agência Senado.
Carlos Magno
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