O plenário do Tribunal de Contas da União (TCU) aprovou
nesta quarta-feira (18), por 7 votos a 1, o modelo de privatização da
Eletrobras, estatal considerada a maior empresa energética da América Latina.
Esta era a última etapa pendente para que o governo pudesse executar o processo
de desestatização da companhia, o que pode ocorrer ainda em 2022.
Votaram a favor os ministros Aroldo Cedraz (relator),
Benjamin Zymler, Bruno Dantas, Augusto Nardes, Jorge Oliveira, Antonio
Anastasia e Walton Alencar Rodrigues. O ministro Vital do Rêgo, que era o
revisor do processo, votou contra.

Foto: Fábio Pinheiro/TCU
Aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo
presidente da República em meados do ano passado, a privatização da Eletrobras
aguardava uma análise do TCU para ser concluída. A Corte de contas já havia
aprovado, em fevereiro deste ano, a modelagem financeira da desestatização e,
agora, validou a forma como a empresa será repassada para controle acionário
privado, nos moldes propostos pelo governo federal, por meio da venda de
papéis.
Divergências
O julgamento foi suspenso no final de abril após pedido de
vistas do ministro revisor, Vital do Rêgo. O relator do processo, ministro
Aroldo Cedraz, já havia apresentado seu voto a favor do modelo de privatização
na sessão anterior. Ao retomar o voto nesta quarta, Vital do Rêgo afirmou que a
desestatização apresenta seis ilegalidades e defendeu que o processo não
poderia prosseguir sem que fossem corrigidas.
Antes do julgamento do mérito, Vital do Rêgo pediu que o
tribunal suspendesse o processo até que a área técnica do tribunal concluísse a
fiscalização sobre dívidas judiciais vinculadas à companhia, que poderiam
impactar em seu valor de mercado. O pedido, no entanto, foi negado por 7 votos
a 1.
Já em seu voto divergente, Vital do Rêgo apontou as
possíveis irregularidades no processo. Uma delas seria os dividendos acumulados
e não pagos pela Eletronuclear à Eletrobras e, consequentemente, à União. Os
valores atualizados chegam a R$ 2,7 bilhões. Sem esse pagamento, após ser
privatizada, a Eletrobras manteria o controle da Eletronuclear, anulando a
transferência do controle acionário da Eletronuclear para a Empresa Brasileira
de Participações em Energia Nuclear e Binacional (ENBpar).
Essa nova estatal foi criada em setembro do ano passado para
controlar a Eletronuclear e a Itaipu Binacional, duas companhias públicas que
foram retiradas da privatização da Eletrobras.
"Enquanto não for resolvida, senhores, a questão dos
dividendos, a Eletrobras privada terá a maior participação orçamentária votante
na Eletronuclear, desvirtuando a premissa imposta pela Lei 14.182, de que a
Eletronuclear deve seguir controlada pelo poder público", argumentou o
ministro. A Constituição Federal define que a energia nuclear é tema de
segurança nacional e deve ter sua geração controlada pelo Estado.
Vital do Rêgo também questionou a valoração da Itaipu
Binacional. Pela lei da privatização, a nova estatal ENBPar deve pagar um valor
à Eletrobras pela aquisição do controle acionário da Itaipu Binacional. Esse
valor, de R$ 1,2 bilhão, foi considerado "irrisório" pelo ministro.
Outro ponto questionado pelo ministro foram as avaliações
independentes contratadas pelo governo, que teria errado em estimativas sobre
ativos da Eletrobras. "Temos erros de R$ 40 bilhões que precisam ser
revisados antes de concluir essa privatização."
Maioria
Apesar das ponderações do revisor, todos os demais ministros
presentes, com exceção da presidente do TCU, Ana Arraes - que só vota em caso
de empate -, votaram por dar prosseguimento ao processo de privatização da
Eletrobras.
O ministro Augusto Nardes, em seu voto favorável, por
exemplo, citou a expectativa de crescimento do mercado de energia elétrica, com
a chegada dos veículos movidos a eletricidade, em substituição aos movidos a
combustíveis fósseis.
"O mundo está mudando de forma muito rápida, e se nós
não nos adaptarmos, e continuarmos com uma empresa que não tem capacidade de se
auto manter e necessite de subsídios do governo federal, certamente o Brasil
não terá capacidade de crescimento", disse.
Já o ministro Jorge Oliveira elogiou o processo de
capitalização da empresa, que seria diferente de uma "privatização
clássica". "A União deverá ter ainda uma parcela considerável do
capital dessa empresa.Ela está indo para esse processo em uma condição de alta
vantajosidade, a meu ver, que é a de ter dado lucro nos últimos quatro
anos", observou.
Ao proferir voto complementar, o ministro-relator, Aroldo
Cedraz, classificou a sessão como "histórica" e disse que o TCU deu
uma contribuição para a sociedade.
"Não tenho qualquer dúvida de que as próximas gerações
saberão reconhecer as contribuições do Tribunal de Contas da União que essa
operação possa ser realizada de forma a proteger os interesses do Estado e,
acima de tudo, os usuários, que somos nós, a sociedade brasileira, com essa
perspectiva que temos hoje de viabilizar a modernização do setor elétrico
nacional."
Desestatização
O processo de privatização prevê uma capitalização da
companhia. Isso significa que, a princípio, o governo não irá vender a sua
participação atual. Serão emitidas ações para entrada de novos investidores,
diluindo assim o capital da empresa até que a fatia da União seja de, no
máximo, 45%. Apenas se essa oferta primária não der o resultado esperado é que
haverá nova oferta incluindo a venda de ações da própria União.
A modelagem também prevê a segregação de Itaipu Binacional e
da Eletronuclear. As ações que a Eletrobras possui nessas empresas serão
repassadas à Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e
Binacional (ENBpar), nova estatal criada em setembro do ano passado. Dessa
forma, a União manterá controle sobre elas.
A Eletrobras registra lucros líquidos anuais desde 2018 – em
2022, a empresa anunciou lucro líquido de R$ 2,7 bilhões no primeiro trimestre.
Em março de 2021, o governo federal informou a inclusão da
Eletrobras no Programa Nacional de Desestatização, alegando que a medida
possibilitará à empresa melhorar sua capacidade de investimento e contribuir
para o desenvolvimento do setor energético brasileiro. A Eletrobras detém um
terço da capacidade geradora de energia elétrica instalada no país. A companhia
também possui quase a metade do total de linhas de transmissão.
Próximos passos
Após a validação da desestatização da Eletrobras pelo TCU, o
próximo passo é fazer o registro da operação na Comissão de Valores Mobiliários
(CVM), autarquia federal responsável por fiscalizar o mercado de valores e na
Securities and Exchange Commission (SEC), que seria o equivalente à CVM nos
Estados Unidos. Isso ocorre porque a Eletrobras possui ações negociadas na
bolsa de valores do país norte-americano.
Em seguida, começa uma etapa de apresentações da Eletrobras
para potenciais investidores, chamada road show e, por fim, o leilão da
companhia é realizado na Bolsa de Valores brasileira (B3), ainda sem data
prevista – Agência Brasil.
Carlos Magno
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