Uma dúvida jurídica atormenta o Palácio do Planalto. Tudo
porque, se a medida provisória que trata da reforma administrativa não for
aprovada até 3 de junho pelo Congresso, perderá a validade. A situação já seria
preocupante por si só, não fosse um detalhe ainda pior: se for derrotado nessa
votação, o governo poderá ter de recriar até dez ministérios.
Editada em janeiro pelo presidente Jair Bolsonaro, a MP 870
diminuiu o número de pastas, de 29 para 22. O Planalto enfrenta dificuldades na
Câmara e no Senado e já foi informado de que, se a medida não receber sinal
verde, todas as fusões de ministérios serão desfeitas e repartições sairão do
limbo. Agora, porém, há uma interpretação de que, em um cenário assim, a Esplanada
pode até mesmo voltar a ter a configuração do governo de Dilma Rousseff, que
tinha 32 pastas em 2015, menos de um ano antes do impeachment.
Nem mesmo a equipe que cuida dos assuntos jurídicos do
Planalto, no entanto, sabe quantos ministérios teriam de ser ressuscitados e
qual seria o tamanho do primeiro escalão, caso o governo sofra novo revés no
Congresso. Embora muitos avaliem que, se a MP não for aprovada, a Esplanada
deve retomar a estrutura do governo Michel Temer, isso não é ponto pacífico. Na
prática, três auxiliares do presidente consultados pelo Estado disseram que, em
tese, vale o último modelo em vigor – no caso, o desenhado por Temer –, mas é
preciso esperar o acórdão do Supremo Tribunal Federal (STF) para ter certeza.
A controvérsia surgiu porque, em março, o Supremo declarou
inconstitucional uma medida provisória enviada ao Congresso por Temer, que
garantia foro privilegiado a Moreira Franco na Secretaria-Geral da Presidência
e criava o Ministério dos Direitos Humanos. A MP foi contestada pela
Procuradoria-Geral da República e por partidos, sob o argumento de que repetia,
em sua maior parte, trechos de uma outra medida sobre reestruturação
ministerial, apenas com o intuito de beneficiar Moreira. O Supremo aceitou o
pedido por entender que uma norma reeditada em MP, no mesmo período
legislativo, fere a Constituição.
“Agora, se a MP da reforma administrativa não for aprovada,
o governo tem de mandar urgentemente um projeto de lei para cá, porque senão
tudo para”, disse o líder do PP na Câmara, deputado Arthur Lira (AL).
Na prática, independentemente do modelo a ser seguido, se o
Planalto for derrotado voltam à cena, por exemplo, os ministérios do Trabalho e
da Cultura, pastas que existiam tanto no governo Dilma como sob Temer. Além
disso, o robusto Ministério da Economia – hoje sob o comando de Paulo Guedes –
seria dividido. Receberia novamente o nome de Fazenda e o Planejamento migraria
para outro ministério. O quadro se repetiria na Justiça. O ministério entregue
por Bolsonaro a Sérgio Moro teria de ser desmembrado e, com isso, a Segurança
Pública sairia da alçada do ex-juiz da Lava Jato.
‘Risco zero’
Apesar dos percalços, o ministro da Casa Civil, Onyx
Lorenzoni, procurou demonstrar tranquilidade e disse ontem que há “risco zero”
de a MP caducar. Na mesma linha, o advogado-geral da União, André Luiz
Mendonça, observou que a reestruturação da Esplanada é uma prerrogativa do
governo, e não do Legislativo. “Acreditamos no diálogo com o Congresso”,
argumentou ele.
Se depender do Centrão, no entanto, o governo enfrentará mais
problemas. O bloco de partidos que reúne cerca de 250 dos 513 deputados não se
animou nem mesmo com a decisão de Bolsonaro de dividir o Ministério do
Desenvolvimento Regional, recriando as pastas de Cidades e Integração Nacional.
Na tentativa de virar o jogo e mostrar que, agora, é o
Congresso quem não aceita o toma lá, dá cá, líderes do Centrão decidiram tirar
o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) das mãos de Moro. Nos
bastidores, dirigentes do grupo repetem que a articulação política do governo é
falha e já se unem com a oposição.
A mexida nos ministérios também é alvo de cinco ações
impetradas por partidos no Supremo, que ainda não foram analisadas pelo
plenário da Corte – Estadão.
Carlos Magno
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